sábado, 30 de abril de 2011

Paciência



Só um pouco do muito que existe
Não é muito do pouco que quero
Sou um dos poucos que há muito resiste
Pois é muito o que aos poucos espero

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Bento






No litoral paranaense, prá lá da serra do mar, um condomínio brota da restinga rala, junto a ninhos de Quero-queros e Corujas Buraqueiras. Nessa terra de vibrações sazonais, de muitos quartos e poucas fronhas, nosso personagem flui de baía em baía, cuidando de florestas e lagos artificiais deixados a esmo, largados à maresia.


É manhã de sexta-feira, um santo feriado para os feridos do pós Carnaval. Montado em seu corcel prateado da Caloi, Bento segue com pedaladas firmes, focado como um soldado, que sabe o castelo a invadir.
O calor já não judia mais da pele morena, que tanto viu o sol. Nosso guerreiro luta em terra própria, sabe dos anos em que o mar foi seu vizinho. E quantos anos! Os poucos fios descoloridos sobre o crânio, avisam que terceira idade já chegou ou está a bater na porta. Os dentes, estes tão restritos quanto a cabeleira, mostram um sorriso que faria os britânicos legalizarem a escova de dentes.
Mas para por fim aos devaneios da beleza superficial, citemos aquilo que faz de Bento, e só Bento um personagem em Atami e redondezas.
Já no seu destino, uma casa com cerca multicor e cães que só latem, Bento entra com ares de senhor, pois sabe que é bem vindo. A grama verde que da contraste a vizinhança é tapete de seu feitio, e é dela que se fala na sua abordagem inicial:

- Ooô danana tabouneta ssa grama. Cortetuidnini quata.

Inebriada pela morbidez matinal, a fala do velho jardineiro chega como uma sopa de letras nos ouvidos pouco sensíveis da dona da casa. A resposta acaba sendo um convite para uma xícara de café. E Bento, tomando proveito de sua anfitriã, inicia então uma prosa unilateral.
O assunto agora é o seu mais novo hobby, este que antes fora preenchido por uma campanha inter-municipal de bocha de relativo sucesso. O homem, pelo que afirma, não usa mais do seu tempo para lançar bolas de pedra fria, mas sim senhoras septuagenárias aos ares, com passos de dança ousados até para patinadores de gelo.
O grupo de dança da melhor idade, é mais uma prova do amor inusitado que este jardineiro sente por mulheres de maturidade insuperável. Não existem limites para o romantismo deste Casanova geriátrico. Se tiver acima dos 65, Bento não poupa.
Por coincidência naquele mesmo dia, na mesma casa dos cães que só latem, uma matriarca, nos seus fresquíssimos 88 anos de idade, rabiscava letras em uma revista de palavras cruzadas. Um rápido trocar de olhares , foi o suficiente para que a conversa saísse da mesa de café. O dançarino levantou-se, e foi em direção a avó. Então como um japonês, que tem o tacto para lidar com bonsais, pegou as mãos da senhora e iniciou um tutorial prático da dança em duplas. A valsa, mesmo com a mulher sentada, alongou se por vários minutos cômicos.
Apesar dos risos da dona da casa, aquilo ,para Bento, era como a primavera, como uma dança de acasalamento de flamingos. Como desejava que fosse eterno! E realmente parecia que seria, até que um celular vibrou no bolso do homem. Do outro lado da linha uma mulher de 68 anos, com um anel de ouro na mão esquerda, esbravejava perguntas retóricas. Estava na hora do jardineiro voltar. A verdadeira dança começaria em casa.

domingo, 17 de abril de 2011

Incompleto


Com o primeiro raio de sol da manhã, acordo de uma noite interminável. Do meu lado, teu corpo é frio como as lágrimas no travesseiro. Tua mão, esticada sobre o lençol, não responde mais aos meus afagos. O sorriso do dia anterior, a conversa sobre o casamento, instantes que diziam sobre uma vida inteira. Instantes que, logo mais, seriam os últimos. O reflexo pálido no espelho traz lembranças. O café insalubre, a conversa jogada fora, o dia promissor. Mesmo sem vida, sua beleza quase que transmite um sono prolongado. Um descanso merecido, de uma vida dedicada, de uma vida inacabada. A doença veio junto com as promessas, e, iludido pela utopia da eternidade, neguei tua vontade de seguir adiante. Agora ao seu lado, não sou digno de compreender. Seria bom se fossemos juntos. Como seria bom. Mas sem você sou um covarde, incapaz de tirar a própria vida. Nessa hora de desespero, o que você me aconselharia? Provavelmente diria algo como : " Não seja egoísta, viva e não reclame ". Sempre foi sábia nas tuas afirmações, uma mulher imponente sobre os demais. Diante da dor, resistiu contra o desagrado. Coitada, como sofreu. O fim silencioso do teu sofrimento, é agora o inicio do meu abismo. Não sei se terei forças, só sei que serei ,daqui pra frente, incompleto.

Incubismo


Do que geométrico, obtuso e convexo

Prefiro um mundo sem forma e sem nexo

Me ensinaram a perfeição das coisas. Falaram que em tudo, há uma causa e uma conseqüência. Perfilaram as incongruências e, sem mais nem menos, negaram todas as afirmações. Afirmaram que com negação se tem coerência. Coerente ou não, jamais duvidem da ciência. Motivos, são para motivar a desistência. Coragem e honra, só pra quem quer morrer de vivência. Porque na geometria da vida, formas são aquelas que ditam o triste ritimo da existência. Nesse pesadelo, me encontro tranquilo só em consciência. O socorro vem do destino, com toda sua irreverência. Ele me pergunta o que quero, eu respondo: Felicidade de preferência

Contra o centrão vote periferia

Patrícios e plebeus Centro e periferia Castelo e feudo Cobertura e laje Condomínio e comunidade Derrubar os muros Apagar as luzes Limpar o r...