sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Pinus Porrástico


Natal, lá em casa, nunca foi um episódio bíblico. Eu, e suspeito que a minha madre também, víamos a festividade de final de ano como apenas mais uma oportunidade para praticar as incongruências familiares, com uma overdose de trocas materiais e sorrisos forçados dignos de um lifting ala pitanguy. Por assim dizer, não havia um esforço mutuo e planejado, para tornar a nossa caverna, nas ruas onduladas do Ahú, um lugar receptivo para o gordinho senil e polar.Coitado do Noel, se por acaso um dia esse resolvesse adentrar pela chaminé, ia dar de bunda nas ferramentas de jardinagem e cair de boca no saco de titica de galinha, que minha mãe usava pra praticar suas inabilidades no quintal.

Mas houve um dia, que o improvável aconteceu. Nos deram um conjunto, completo, de um presépio, que de tão perfeito parecia a cena real do nascimento do mini Messias. Aquilo, de forma alguma, poderia passar batido. Era a primeira vez que a casa se entusiasmava para o evento natalino, como num prólogo de uma obra épica. Colocamos luzinhas no quintal, toalhas de mesa bordadas e montamos o presépio. Mas ainda faltava um básico, a árvore.

Foi então que se fez a merda. Maldita árvore, a proximidade com o dia 24 e a loucura nas lojas da cidade, forçaram a dona daquela casa, nas ruas curvilíneas do Ahú, a ter uma das ideias mais bizonhas da sua vida. (Mais absurda, talvez, do que a vez que decidiu que sabia fazer pizza quadrada). Ao invés de optar por um pinheiro de petróleo verde, decidiu buscar uma alternativa mais realista e tangível. Pegou um galho de Araucaria, desses de tamanho e formato fiel a árvore original, e colocou em um vaso grande de terra e pedras. Pra quem desconhece, a Araucaria é outro nome dado ao pinheiro-do-paraná (Araucaria angustifolia), árvore típica da região sul e símbolo do estado do Paraná. O nome ciêntifico da espécie, deve se as folhas duras e pontiagudas. E é bem nesse quesito, que entra o meu drama.

Lá estava o pinheirinho, silencioso e nu, a espera dos seus ornamentos de rei. E cabia a mim, na disponibilidade do ócio juvenil , vestir o maldito para as festividades. No meu dia de decorador, e diga se de passagem, um dia inteiro, cheguei a um diagnóstico de que enfeites de natal, não foram feitos para enfeitar samambaias, bambuzais e muito menos pinheiros-do-paraná. No final, com meus dedos sangrando, o que se empunha na minha frente, faria qualquer Papai Noel correr de medo e ainda pedir um pedaço da pizza quadrada da minha mãe.

Voltando do encontro familiar, já numa manha pós-natalina, percebi que não havia nada em baixo do pinheirinho que me exigira tamanha dedicação. Velhinho mal agradecido, espero que depois de comer titica, tenha espetado a bunda gorda nas folhas pontiagudas.

Pelo menos, não foi mais um natal sem sal.




P.S : Mãe se você ler isso, não desista de cozinhar.


Só arranje outra cobaia. bjos


sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Vamos rir mais


Ao postar-me na fila do caixa, deparo com dois elementos igualmente uniformizados, com credenciais penduradas no pescoço. Os cabelos descoloridos e despenteados revelam indiferença para com a aparência. As palavras impressas nas costas das camisetas indicam: VII Romaria de Pontal do Paraná. Está claro que me encontro atrás de duas devotas.
As romeiras, ambas, carregam uma garrafa de Sprite na mão, e olham atentamente para os clientes do restaurante de estrada como quem lança maldições, ou reza pela salvação. Ao menos era isso que eu imaginava das vovós fiéis à crença.
Mas então, uma das senhoras fala, direcionando se a outra:
-Você não ia pegar uma cerveja?
-Não, eu to de ressaca - Responde a amiga de culto
-Ah, eu também - Rebate a colega

Touchê! O relato acima não é solvente para o cérebro, nem xeque-mate de cinema. A simplicidade do dialogo, na casualidade do contexto, carece de espaço para efeitos especiais e orçamentos hollywoodianos. Para se julgar aqui, é preciso resgatar algo do tempo que a pouca noção de espaço atiçava o apego as coisas simples da vida. Do tempo que o leitor era criança.
Não se trata do lúdico, como aparenta, mas algo muito além disso. Mas paremos por ai, e voltemos para o simples. Afinal, porque nós rezamos?
Seria para buscar o melhor para o próximo? Ou para salvar a nossa pele no dia do juízo final, enquanto nos deliciamos com o mel dos pecados universais? Olhando para o ocorrido no restaurante, pode se concluir em uma única exclamação: FODA–SE!

Independente de religião, país, time de futebol, vamos deixar todo o lado chato prestando contas com a consciência. Vamos silenciar a verdadeira burrice, e louvar o burro pelos momentos de alegria. Sejamos os ativistas da ironia. Que comam merda os ofendidos, pois amanha serão eles a gargalhar sobre outros. Da carta de prazeres, pediremos todos, e que se faça fiado com o suposto Deus. Vamos antes de tudo, fazer tudo de novo.
E em cada momento, que nos deixemos levar,
Vamos rir mais.

Contra o centrão vote periferia

Patrícios e plebeus Centro e periferia Castelo e feudo Cobertura e laje Condomínio e comunidade Derrubar os muros Apagar as luzes Limpar o r...